Coluna de Ciências

Sem tolerância, sobra a estupidez!

O diálogo representa o meio mais eficiente para a evolução da mente humana. Sócrates e discípulos acreditavam que para se chegar à verdade é necessário o diálogo. O questionador, o crítico e o opositor tem o papel de ajudar o interlocutor a dar luz à verdade. As novas gerações devem exigir o diálogo e a transparência nas relações humanas pessoais e no trabalho.

Sócrates, Platão e Aristóteles ensinavam caminhando e conversando longamente. Esta prática ficou conhecida como filosofia parapatética. Para que houvesse um ambiente adequado, uma despreocupação com o tempo, para que o aprendizado pudesse ocorrer naturalmente, Platão escolheu um bosque próximo a Atenas. Neste local montou sua escola conhecida como Academia, pois o nome deste bosque era Academus, um lendário herói. Até hoje, Academia é sinônimo de escola, universidade ou instituição cheia de erudição e sabedoria. A Academia de Platão foi a precursora mais primitiva da Universidade.

Aristóteles, o aluno mais destacado de Platão, quando montou sua escola, escolheu um local nos arredores de Atenas onde havia um templo oferecido a Apolo Liceu, o matador de lobos. A escola de Aristóteles ficou conhecida como Liceu o que identifica até hoje algumas escolas.

Diálogo implica em tolerância com o diferente, com aquele que ainda não sabe, mas pode aprender e ainda com quem resiste, ou nega, a mudar e evoluir. O diálogo implica em convencer, ou “vencer com” aquele que questiona, ou seja, se convencem. No diálogo deve-se “ter” e “ser” de ideias; aquele que convence o faz pelo argumento e não pelo grito, pela voz grossa e empostada ou pelo emprego de palavras difíceis e raras, ou ainda pelo uso de tecnologia avançada ou armas!

Em qualquer atividade deve-se ouvir a todos, não importa se concordando ou discordando. Há de se ter paciência e tolerância com os que ainda não sabem ou resistem em aprender. As discrepâncias e as controvérsias de opiniões são fontes de progresso, e por isto que são necessárias, sempre, as salvaguardas da liberdade de pensamento na sociedade.

Os dogmas e a fé são próprios da religião e da política. O dogma e a fé não são tolerantes com as discordâncias e discrepâncias. Dialogar, debater e discordar são exercícios para adquirir capacidade analítica e crítica. Sabedoria e tolerância são habilidades que se desenvolve apenas com muito esforço pessoal, tempo para reflexões ou meditações.

Como seres evoluídos, que instalemos em nossas atividades diárias o dialogo, o discurso, o debate e o convencimento. Isto requer muita paciência, tolerância e amor. Que cada um de nós descubra em si mesmo o potencial de aprender, evoluir, empreender e adquirir a consciência de seu papel no contexto familiar e social. Que aquele que pensa diferente, não vire o inimigo, mas apenas uma pessoa que não raciocina como você, mas que pode ser seu amigo!

As gerações atuais cada vez mais podem seguir os ensinamentos dos filósofos gregos e das palavras de Galileu Galilei: “Não se deixem guiar pela autoridade de alguém. Façam os experimentos, confirmem os fatos. Pensem! Não obedeçam cegamente ao que outros dizem só por terem a fama de sábios”. A necessidade do diálogo ou da discussão pode ser resumida na frase de Norberto Bobbio: “Aprendi a respeitar as ideias dos outros, a conter-me diante dos segredos de cada consciência, a compreender antes de discutir, a discutir antes de condenar.”

Em cada conversa e opinião que escuto vejo sementinhas de intolerância com partidos, pessoas, ideias e comportamentos! Sementinhas de quebras de regras e vontade de fazer justiça com as próprias mãos! Em homenagem à França, permita-me questionar: você ensina mesmo a seus filhos e alunos a prática do diálogo com o diferente, mesmo que, com presidiários, drogados e subalternos? Você dá o exemplo em casa? Você conversa com seus filhos sobre os limites de dogmas e as consequências ruins de uma fé cega e irrestrita?

Precisamos, todas as horas, semear a tolerância com os diferentes na prática do diálogo, com respeito absoluto às regras e em qualquer situação! Fora disto só restará, cedo ou tarde, ditaduras, torturas e terror!

Reflitamos.


(Alberto Consolaro – Professor Titular da USP e Colunista de Ciências do JC)

É de chorar: a intolerância e a estupidez, como as grosserias, são forjados desde a infância no dia a dia.