Coluna de Ciências
Clarear os dentes provoca câncer?
Sim e não! Se for feita por profissional treinado com técnica adequada e aplicada no consultório a resposta é NÃO! Ser a técnica for ultrapassada sem proteger a mucosa, mesmo no consultório, ou se aplicada pelo paciente em casa, a resposta é SIM!
Esta pergunta me fazem quase todos os dias! Todo clareador é à base de água oxigenada ou peróxido de hidrogênio. Até ser levado à boca, alguns clareadores recebem nomes como peróxido de carbamida ou de ureia; ao atuar o produto é peróxido de hidrogênio.
Água oxigenada usada de forma eventual atua como antisséptico em feridas e doenças. As células usam-na como arma para matar bactérias fagocitadas. O uso eventual não traz danos significantes para as células, mas o uso frequente pode queimar tecidos e ajudar na mudanças do DNA que levem ao câncer, especialmente na mucosa gastrintestinal como boca, orofaringe, esôfago, intestino e reto.
No processamento de alimentos, a água oxigenada é usada e acaba sendo ingerida em pequenas concentrações que, supostamente, não trazem consequências à saúde e são autorizadas pela Anvisa. No café tem-se uma quantidade irrisória de peróxido de hidrogênio, mas ele está lá todos os dias.
O peróxido de hidrogênio potencializa as alterações celulares no DNA que, se tornarem estáveis, podem dar origem a neoplasia maligna ou câncer nos tecidos de revestimento. Estas alterações são induzidas na boca pelo HPV, tabaco, álcool, radiações solares, produtos químicos dos alimentos e de higiene pessoal.
Produtos químicos e outros fatores que induzem alterações celulares que levem ao câncer são muito frequentes na boca e alguns são inevitáveis. Devemos diminuir ao máximo a exposição da mucosa a qualquer agente indutor da carcinogênese, mas também evitar aqueles produtos que possam potencializar seus efeitos, como o peróxido de hidrogênio.
Os dentifrícios tinham peróxido de hidrogênio na composição em níveis não aceitáveis, mas uma ação conjunta dos Conselhos de Odontologia, da Associação de Fabricantes e outras entidades junto a Anvisa, resultou em regulação e maiores cuidados. Análises recentes revelam que os dentifrícios agora tem níveis mínimos ou ausentes de peróxido de hidrogênio o que representa um grande avanço.
Técnica
Se ao clarear os dentes o profissional aplicar uma barreira protetora resinosa sobre a gengiva, ou usar uma película de borracha ou plástico, que escondam a mucosa do clareador, não haverá como o peróxido aplicado nos dentes potencializar os efeitos carcinogênicos na boca.
Depois que aplicou o clareador, deve-se eliminar o peróxido de hidrogênio sugando-o totalmente. Apenas depois de tudo sugado, ‘apenas depois’, o profissional vai jogar água na boca do paciente. Se jogar água ou ar antes disto para tirar o clareador, ele se espalhará por toda boca e ao engolir a saliva, vai um monte de peroxido de hidrogênio para a boca inteira, orofaringe, esôfago, intestino e reto. Uma vez sugado todo clareador, conferido o procedimento, se deve remover a barreira protetora.
O uso caseiro do clareador com moldeira, por mais perfeita que seja, inevitavelmente, o peróxido de hidrogênio também vai atuar sobre a mucosa gengival e bucal. O paciente tende a deixar mais tempo o clareador nos dentes, faz outras coisas e até dorme, esquece de tirar e engole boa parte do produto. Não se deve clarear dentes em casa.
Estas recomendações não importa se o paciente for ou não fumante, viciado em álcool ou que tenha outro fator carcinogênico identificado na boca. Independente disto, e em todos os humanos, desde que se aplique o peróxido de hidrogênio na mucosa bucal, haverá potencialização de fatores carcinogênicos ao qual todos estão expostos! O uso eventual do peróxido de hidrogênio não teria problema, pois o seu efeito requer tempo e repetição. Os danos provocados eventualmente no DNA seriam reparados, mas os agentes carcinogênicos na boca e o peróxido de hidrogênio em suas varias formas estão constantemente na boca: inevitavelmente!
Não esqueçamos: câncer é resultante do somatório de efeitos no tempo e se manifestarão apenas depois de muitos anos. Nos cuidemos!